Sabemos que Angola tem uma vasta diversidade de espécies animais mas infelizmente ainda não temos uma noção clara da importância delas para a nossa vida. Neste momento, as tartarugas que desovam e aninham ao longo da costa Angolana têm passado por um extermínio incivil brutal e insolente que pouco se tem dado atenção.
Quantas espécies de Tartarugas existem em Angola?
Um estudo feito por Thomas Carr e Nicole Carr publicado em 1991 reporta que existiam 5 espécies distintas de tartarugas marinhas das 7 espécies que existem mundialmente. O mesmo estudo diz que estas 5 espécies aninhavam e desovavam pela costa angolana:
- Tartaruga de Couro (Dermochelys coriacea) agora em estado vulnerável.
- Tartaruga-oliva (Lepidochelys olivacea) agora em estado vulnerável.
- Tartaruga verde (chelonia mydas) agora em estado ameaçado.
- Tartaruga marinha comum (Caretta caretta) em estado vulnerável.
- Tartaruga-de-pente ou tartaruga-de-escamas (Eretmochelys imbricata) em estado crítico de extinção.
Estas cinco espécies são na realidade as que mais necessitam de protecção, estando as classificações acima mencionadas de acordo com dados da conservação das populações mundiais atribuídas pela Lista Vermelha da União de Conservação da Natureza (IUCN). É importante destacar que quase todas estas espécies estão em perigo de extinção segundo o Fundo Mundial para Protecção da Natureza (WWF). É difícil estimar a actual situação das tartarugas em Angola, especialmente porque Angola não tem nenhum levantamento actual (ou que seja público) sobre o estado das populações, estando muitas delas a decrescer continuamente e possivelmente algumas destas espécies já podem estar extintas no país!
Porque é que as tartarugas correm risco de extinção no mundo e em Angola?
As tartarugas viajam milhares de kilómetros durante as suas vidas e por isso estão expostas a inúmeros riscos naturais e também a riscos causados por humanos. Primeiramente, as tartarugas têm sido alvo da nossa própria poluição. Quase todo o lixo que produzimos nas cidades costeiras vai parar ao mar. Isto deve-se pelo facto de não termos um sistema de recolha e tratamento adequado de resíduos em Angola mas também à carência de educação ambiental. As tartarugas, bem como muitos outros animais marinhos, ingerem o lixo no mar pois confundem-o com comida e isto acaba por prejudicar a sua saúde, quase sempre a ponto de as matar.
As populações de tartarugas também têm sofrido outros tipos de pressões por parte dos humanos:
Caça às tartarugas
Esta é a maior causa da diminuição de tartarugas em Angola, pois são caçadas, para consumo humano, de forma insustentável, especialmente através da pesca artesanal, e os seus ovos são também fonte de alimentação para muitas comunidades costeiras. Supostamente, desde 1972, as tartarugas deveriam estar protegidas pela lei que bane a sua caça. Até recentemente, esta lei tinha uma coima pela caça de tartarugas, definida pelo Decreto Executivo Conjunto n.º 201/16 de 26 de Abril, estipulando uma taxa de indemnização ao estado de 1.624 UCFs, que prefaziam exactamente 144.912 de kwanzas. Esta lei foi posteriormente revogada com a actualização da Lei de Bases da Floresta e da Fauna em 2017 no artigo 98º dando o direito a pessoas singulares ou famílias em comunidades rurais de efectuar caça de susbsistência.
Entretanto, Angola aderiu à Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e Flora Selvagem ameaçadas de Extinção (CITES) que impõe a proibição do abate de espécies em extinção em território nacional, mencionado no Decreto Executivo n.º 469/15 de 13 de Julho. As 5 espécies que residem em Angola estão mencionadas no anexo do CITES, ou seja, elas deveriam estar a ser protegidas, mas infelizmente não é isso que temos visto. A falta de fiscalização e a carência de educação no que concerne à conservação da biodiversidade está a pôr em risco a presença destas espécies em Angola.
Comércio ilegal de tartarugas marinhas
A carne de tartaruga, os ovos e até as carapaças continuam a ser comercializadas apesar de ser ilegal a sua caça e venda pela Convenção Internacional de Comércio de Espécies de Fauna e Flora em Perigo de Extinção (CITES).
Perda de habitat
O desenvolvimento substancial das cidades costeiras tem directamente destruído e diminuído o espaço em que as tartarugas costumam desovar e aninhar, bem como também aumentou o distúrbio das tartarugas causadas pelo aumento de tráfico de veículos marinhos.
Alterações climáticas
Todos os estágios da vida das tartarugas são afectados pela temperatura, incluindo a definição do sexo dos filhos das tartarugas. O aumento da temperatura no mar interrompe a razão natural dos sexos, resultando no nascimento de menos machos. Isto está a criar um grande desequilíbrio nas populações de tartarugas mundialmente, podendo até ser uma razão para o extermínio delas no mundo. A instabilidade do clima também provoca mais tempestades severas e o aumento do nível do mar, destruindo fontes de alimentação das tartarugas e potencialmente também destruindo praias importantes para o aninhamento e desova.
As tartarugas demoram décadas a reproduzir e voltam as mesmas praias que nasceram para meter os seus ovos.
Porque é que as tartarugas são importantes para o mar e para nós?
As tartarugas são consideradas espécies chave para os ecossistemas marinhos. Elas são importantes, principalmente por serem uma conexão na cascata trófica (interações que controlam os ecossistemas) marinha, isto é, elas influenciam directamente muitas outras espécies que também habitam o mar. Se as tartarugas continuarem a ser removidas do seu habitat isto pode causar um desiquilíbrio no ecossistema, potencialmente afectando outras espécies que habitam o mesmo ecossistema. Em outras palavras, elas são extremamente importantes para manter o mar saudável.
Do ponto de vista económico, elas têm alto benefício turístico, através da observação de tartarugas no mar e também durante o momento em que elas saem do ninho para entrar no mar (ecoturismo). Pesquisas mostram que o ecoturismo das tartarugas marinhas consegue gerar mais lucros do que a venda de seus ovos, da sua carne e das suas carapaças – portanto, elas são mais valiosas vivas do que mortas.
Programas ambientais para conservação das tartarugas em Angola
Neste momento existem dois projectos de conservação das tartarugas em Angola que têm como objectivo a sensibilização e educação das comunidades locais bem como a protecção das tartarugas durante o aninhamento e desova, o auxílio às tartarugas na encubação dos seus ovos e a realização de estudos e monitoramento das tartarugas. Estes projectos são:
– Projecto Kitabanga: Projecto do departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade Agostinho Neto, implementado desde 2003, e que, até então, já conseguiu proteger cerca de vinte mil tartarugas durante a fase de desova com vários locais de protecção ao longo da costa de Angola: Soyo, Kissembo, Palmeirinhas, Sangano, Longa, Cuio e Manono (Bentiaba).
– Projecto Cambeú: Projecto que iniciou em 2017, na praia da Restinga na cidade do Lobito, Benguela. Este projecto começou com 2 residentes locais (fundadores) mas agora conta com o apoio do Instituto Jean-Piaget, tem um convênio com a Universidade de Aveiro para assessoramento da parte técnica (biologia marinha), e conta com o apoio de voluntários que contribuem para a protecção das tartarugas. De momento tem 4 áreas de intervenção: Restinga, Compão e a Praia Bebé – Benguela, e também na Musserra, Zaire.
O que a EcoAngola está a fazer e o que tu podes fazer
A EcoAngola está a tentar unir os esforços de todos os projectos e organizações que primam pela sustentabilidade, conservação ambiental e melhoria do bem-estar social. Criamos o Movimento Verde para que as organizações e pessoas se possam juntar a projectos sociais e ambientais de forma a darmos o nosso contributo para juntos enfrentarmos a presente crise ambiental e social que assola o país. Regista-te e junta-te a família do Movimento Verde! Também te podes voluntariar em projectos, campanhas e iniciativas da EcoAngola. Basta acompanhares as nossas campanhas, eventos e actividades no nosso website e redes sociais – não há desculpas!
O Projecto Cambeú também já faz parte do Movimento Verde da EcoAngola. Muito obrigado pelo vosso esforço e dedicação.
Oportunidade para estágios e voluntariado:
O Projecto Cambeú está à procura de voluntários na região de Benguela e também à procura de estagiários que estejam a estudar Biologia. Caso queira saber mais informações sobre os estágios do Projecto Cambeú, por favor enviar um e-mail para cambeuproject@outlook.com.
O Projecto Kitabanga está aberto a receber voluntários em várias províncias. Para mais informações sobre como participar visitem a página do Facebook do Projecto Kitabanga.
Ecologista e bióloga ambiental angolana, apaixonada por pessoas, natureza e ciência; focada no desenvolvimento de soluções para a conservação da biodiversidade, direitos humanos e justiça climática, mobilizando para a acção. "Liderança ética e empática é parte do meu "print", e a comunicação carismática é simplesmente a minha maneira de ser".