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Tubarões em Angola: Generalidades, Ameaças e Conservação

Registos fósseis demonstram que os tubarões vivem há 420 milhões de anos no oceano (Inoue et al., 2010), tendo sobrevivido aos dinossauros e a muitas outras formas de vida (WWF, sem data), sendo assim considerados verdadeiros anciãos dos oceanos.

Embora frequentemente retratados como vilões, os tubarões são seres muito mais fascinantes e complexos do que aparentam. Mas afinal quem são estes misteriosos, e muitas vezes, temidos animais que fazem do oceano o seu lar?

Figura 1: Tubarão. Imagem ilustrativa.
Fonte: www.natureaustralia.org.au

Classificação Taxonómica

Reino: Animalia

Filo: Chordata

Classe: Chondrichthyes

Os tubarões pertencem ao mais antigo grupo vivo de vertebrados com mandíbulas, os Chondrichthyes (Inoue et al., 2010), e a Ordem a que pertencem varia consoante a espécie em questão. Existem 8 Ordens de tubarões: Carcharhiniformes, Heterodontiformes, Hexanchiformes, Lamniformes, Orectolobiformes, Pristiophoriformes, Squaliformes, e Squatiniformes (Nair & Zacharia, 2015).

Generalidades sobre os tubarões

No mundo foram identificadas 510 espécies de tubarões, mas considerando que mais de 80% dos oceanos permanece não mapeado, não observado e inexplorado, os cientistas acreditam que ainda existem mais espécies por descobrir (NOAA, 2021). 

Todas as espécies de tubarão pertencem a subclasse Elasmobranchii, tendo em comum o facto de serem peixes cartilaginosos (com o esqueleto formado por cartilagem) (Zangerl, 1981), carnívoros (alimentando-se maioritariamente de plâncton, peixes, tartarugas marinhas, moluscos e mamíferos marinhos), com respiração branquial (obtendo oxigénio quando a água do mar passa pelas guelras) e frequentemente habitam em mar aberto (Hickman et al., 2001; Nair & Zacharia, 2015; WWF, sem data), podendo ser encontrados a impressionantes profundidades de 1000 metros, como as espécies descobertas em 2020 na Nova Zelândia, de grande profundidade, que brilham no escuro (fenómeno da bioluminescência) (Mallefet et al., 2021). No entanto, características morfológicas, desde padrões de coloração, distribuição de habitats, formato e tamanho da cabeça, tamanho do corpo e das barbatanas e até mesmo alguns caracteres fisiológicos e comportamentais, estabelecem diferenças drásticas entre as diversas espécies. A reprodução dos tubarões é um exemplo interessante das diferenças fisiológicas, pois de acordo com o tipo de espécie, os tubarões podem ser vivíparos, ovíparos ou ovovivíparos (Hickman et al., 2001).

Os tubarões são considerados espécies chave e reguladoras dos ecossistemas, por serem predadores essenciais à ordem natural dos ecossistemas marinhos, promovendo o equilíbrio na cadeia trófica, auxiliando no controle das populações das espécies que são as suas presas (Motivarash & Fofandi, 2020). 

Fonte: EcoAngola

Tubarões de Angola

Segundo relatórios da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, 2016), em Angola ocorrem diversas espécies de tubarões, entre as quais espécies consideradas globalmente ameaçadas.

Estado de Conservação dos Tubarões em Angola

Com base na Lista Vermelha e critérios de espécies ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, 2021), estima-se que mais de um quarto dos peixes Chondrichthyes (tubarões, raias e quimeras) estão ameaçados de extinção (Dulvy et al., 2014). A maior ameaça que os tubarões encontram, a nível global é a pesca excessiva que consequentemente contribui para o declínio acentuado da biodiversidade e abundância das populações, sendo que actualmente muitas espécies estão ameaçadas de extinção. 

Legislação sobre a protecção das espécies de tubarão 

Embora os tubarões e raias representem um recurso insubstituível para as comunidades costeiras, em desenvolvimento durante séculos, esse equilíbrio único corre o risco de se perder para sempre. Em Angola, no Decreto executivo nº 109/05 de 25 de Novembro que regula as espécies dos recursos biológicos aquáticos cuja pesca é permitida e a quantidade autorizada. Não consta nenhuma espécie de tubarão, e tal facto remete-nos para a ausência de legislação referente a estas espécies, de extrema importância para os ecossistemas marinhos Angolanos.

Estudos recentes confirmam que desde 1970 a abundância global de tubarões e raias oceânicas diminuiu 71% devido a um aumento de 18 vezes na pressão relativa da pesca, levando três quartos dessas espécies a serem ameaçadas de extinção (Pacoureau et al., 2021). É de facto alarmante esta lacuna em requisitos legais referentes à pesca destas espécies em águas Angolanas. A falta de leis relativas à protecção destas espécies está associada também à pouca pesquisa e conhecimento acerca desses animais e os seus habitats associados, em Angola.

A falta de legislação em conjunto com a rápida e crescente procura de tubarões e derivados para consumo interno, devido a falta de outras alternativas de peixe e proteína para consumo das populações, ou possível exportação para o mercado Asiático, revela a fragilidade da situação que os tubarões enfrentam em águas Angolanas.

A falta de informação e sensibilização, junto das comunidades pesqueiras e populações que consomem este tipo de produtos, relativas à importância destas espécies e consequências do seu declínio é praticamente nula, o que faz com que episódios de captura em massa, como os descritos no final de 2020 pela EcoAngola (Figura 2), aconteçam. 

Com os nossos oceanos degradados, restaurar as populações de tubarões é a chave para melhorar a resiliência dos ecossistemas marinhos e evitar danos irreparáveis devido às mudanças climáticas.

Com os nossos oceanos degradados, restaurar as populações de tubarões é a chave para melhorar a resiliência dos ecossistemas marinhos e evitar danos irreparáveis devido às mudanças climáticas. Enquanto a diversidade de espécies de tubarões adiciona complexidade aos nossos esforços de conservação, devido à pesca excessiva, à demanda de barbatanas e carne, o seu rápido declínio aumenta a urgência da tarefa.

Fonte: EcoAngola

Como ajudar?

Não existem actualmente em Angola informações sobre os volumes de captura, desembarques, composição de espécies e dados sobre o impacto das pescarias relativamente às populações de tubarões. De maneira a entender o estado das espécies de tubarões e raias que têm interacção directa com a pesca em Angola, o Angola Elasmo Project foi lançado em Outubro de 2016, por Ana Lúcia Furtado Soares, visando assim avaliar os impactos da pesca em elasmobrânquios em Angola (Figura 3). Devido à falta de apoios, apenas no presente ano, 2021, esta iniciativa conseguirá arrancar a 100% na forma de um projecto de Doutoramento da mesma. Os seus principais objectivos são identificar e caracterizar a pesca artesanal e semi-industrial que opera ao longo da costa, recolhendo informações sobre as formas de pesca, locais de captura e principais alvos, assim como realizar o levantamento de informações biológicas de espécies e avaliar a diversidade e abundância relativa de tubarões e raias pescados.

Este projecto de pesquisa tem como fim, aumentar o conhecimento, fornecendo informações e dados científicos de longo prazo, para preencher a lacuna de dados específicos referentes a espécies de elasmobrânquios e assim compreender a sua biodiversidade em Angola. Outra componente deste projecto será a conservação destas espécies, envolvendo o público em workshops, campanhas educacionais e de sensibilização, em escolas, comunidades pesqueiras e comunidade Académica. O foco destas actividades deve, não só, ser nos princípios da conservação dos tubarões e raias, mas também nos princípios básicos da biodiversidade marinha, conservação e pesca sustentável, tópicos com grande urgência a serem discutidos entre a população angolana.

Figura 3: Um tubarão Cação-Liso (Mustelus mustelus) e uma raia dos olhos (Raja miraletus) fotografados após uma pescaria de tipo de barco chata.
Fonte: Angola Elasmo Project

É extremamente importante levantar preocupações sobre a situação dos ecossistemas marinhos da África Ocidental, especialmente em países como Angola, onde não há dados marinhos suficientes, há falta de sensibilização relativamente à conservação ambiental, falta de políticas relativas à conservação e pescas, e quase nenhum indicador de que esta situação dramática será abordada em breve. 

Apesar de não existirem ainda dados concretos para a situação actual dos tubarões em Angola, relatos fotográficos, associações voltadas ao ambiente como a EcoAngola e projectos de pesquisa como o Angola Elasmo Project, sugerem que existe uma situação de rápido declínio dos mesmos e como tal, medidas governamentais, mais iniciativas de pesquisa destas espécies e sensibilização são recomendadas para tentar reverter esta situação. 

Um oceano sem tubarões não é um oceano saudável e sem eles danos irreparáveis serão causados, que terão consequências directas em nós, humanos. 

Saiba mais sobre o Angola Elasmo Project em: 

Referências

  1. Food and Agriculture Organization of United Nations. (2016). Carpenter K. E. & De Angelis, N. FAO Species Identification Guide for Fishery Purposes: The Living Marine Resources of the Eastern Central Atlantic. Volume 2 Bivalves, gastropods, hagfishes, sharks, batoid fishes and chimaeras, Reproduced with permission.
  2. Hickman, C., Roberts, L., & Larson, A. (2001). Integrated Principles of Zoology. New York: McGraw-Hil.
  3. Inoue, J. G.; Miya, M.; Lam, K.; Tay, B.; Danks, J.A. et al. 2010.v Evolutionary Origin and Phylogeny of the Modern Holocephalans (Chondrichthyes: Chimaeriformes): A Mitogenomic Perspective. Molecular Biology and Evolution: 27(11), pp. 2576-2586.
  4. IUCN. (2021). Obtido de The IUCN Red List of Threatened Species. Version 2020-3: https://www.iucnredlist.org 
  5. Mallefet, J.; Stevens, D. W.; Duchatelet, L. (2021): Bioluminescence of the Largest Luminous Vertebrate, the Kitefin Shark, Dalatias licha: First Insights and Comparative Aspects. Front. Mar. Sci.
  6. Motivarash, Y. & Fofandi, D. (2020): Importance of sharks in ocean ecosystem. Journal of Entomology and Zoology Studies 8(1):611-613
  7. Nair, R. J. & Zacharia, P. U. (2015): An introduction to the classification of elasmobranchs. Central Marine Fisheries Research Institute, Kochi-682 018.
  8. NOAA – National Ocean Service: How much of the ocean have we explored? Disponível em: https://oceanservice.noaa.gov/facts/exploration.html Consultado em Maio de 2021.
  9. Pacoureau, N., Rigby, C.L., Kyne, P.M. et al. Half a century of global decline in oceanic sharks and rays. Nature 589, 567–571 (2021). https://doi.org/10.1038/s41586-020-03173-9 
  10. WWF – World Wildlife Fund: Sharks. Disponível em: https://www.worldwildlife.org/species/shark Consultado a Maio de 2021.
  11. Zangerl, R. (1981): Handbook of Paleoichthyology, Vol. 3A: Chondrichthyes I. Gustav Fischer Verlag, Stuttgart 1981.

Figuras

Figura 1: Tubarão. Imagem ilustrativa. Retirada de: The Nature Conservancy. Disponível em: https://www.natureaustralia.org.au/what-we-do/our-priorities/wildlife/wildlife-stories/sharks/ 

Tubarão-baleia –Disponível em: https://www.worldwildlife.org/species/whale-shark 

Tubarão azul – Disponível em: https://www.marinebio.org/species/blue-sharks/prionace-glauca/ 

Tubarão tigre – Disponível em: https://www.scubadiving.com/keywords/marine-conservation/divers-guide-marine-life-tiger-shark-galeocerdo-cuvier 

Tubarão seda – https://www.guillenphoto.com/en/silky-shark-carcharhinus-falciformis-red-sea-red-sea.html 

Figura 2: https://expansao.co.ao/artigo/138694/autoridades-estao-a-investigar-den-ncia-da-ecoangola-relacionada-com-o-exterminio-de-tubaroes?seccao=5 

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