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Insectos Comestíveis de Angola

A Entomofagia

A Entomofagia é conhecida como a prática de comer insectos. Animais como aranhas, lagartos,  pássaros, peixes, assim como outros insectos são entomófagos. As pessoas no mundo todo comem insectos como parte das suas dietas há milénios. Longe de ser uma curiosidade de alguns povos, esse hábito é encontrado em todos os continentes, alguns guardaram-no e outros esqueceram-no, estimando-se que a Ásia, África, América Latina e Austrália pelo menos 2 milhões de pessoas consomem insectos regularmente (FAO, 2015).

Nesse contexto, este artigo foi criado com o propósito de informar os leitores sobre o uso dos insectos na  dieta angolana, seu valor nutricional e como tornar a entomofagia sustentável sem afectar a biodiversidade.

Figura 1: Gafanhoto frito, uma iguaria consumida em algumas regiões de Angola. Fonte: Portal86

Características gerais dos insectos e sua classificação

Os insectos são na sua maioria animais terrestres com capacidade de voo, características que lhes permitem alcançar fontes de alimentos distantes e diferentes habitats, além de facilitar a fuga dos predadores. Geralmente, têm o corpo dividido em 3 partes, conforme  Santos et al. ( 2018) demonstra:

Figura 2: Ilustração da estrutura do corpo de um gafanhoto. Fonte: Bioeducando.net.

A Classe dos insectos possui 33 ordens, entre as quais estão aqueles em que se enquadram algumas espécies  importantes para a saúde, agricultura e alimentação. 

Figura 3: Imagem da vista dorsal (ver alíneas a) e ventral (ver alíneas b) de algumas ordens da Classe Insecta. Fonte: Revista Ciência Elementar, 2018

Insectos comestíveis e o seu valor nutricional

Mais de 1.900 espécies de insectos são consumidas no mundo e esse número continua a crescer à medida que aparecem novos resultados de pesquisas sobre o assunto, como se pode consultar na lista internacional das espécies de insectos comestíveis publicada pelo taxonomista Yde Jongema, que apresentou o nome das espécies, classificação, estágio e países onde estas são consumidas. Importa enfatizar que a maioria das espécies conhecidas é capturada na natureza e não criada em cativeiro.

Fonte: Adaptado de FAO, 2015.

Eles fornecem proteínas e nutrientes de alta qualidade em comparação com a carne de gado e de peixe, e são particularmente importantes como suplemento alimentar para crianças desnutridas. Estudos têm demonstrado que a carne dos insectos contém quantidades de proteínas e lípidos satisfatórias e ricas em sais minerais e vitaminas. Por exemplo, a formiga da espécie Atta cephalotes (tanajura) possui mais proteínas (42,6%) do que a carne de frango (23%) ou bovina (20%). Os insectos também podem ser ricos em minerais, como: cobre, ferro, magnésio, manganês, fósforo, selénio e zinco, além de ser uma fonte de fibra (ROMEIRO, et al., 2015).

Espécies de insectos consumidas em Angola

Em Angola, é comum vermos à venda nas praças o catato (de Malanje, Bengo e Uíge), o jissombe (do Uíge), a jinguna, o gafanhoto, entre outros insectos. Geralmente são consumidos como aperitivos ou como acompanhantes de um prato de funge, em eventos distintos e até mesmo nas ruas.

Os Bakongos são os que mais usam insectos na sua dieta, com a seguinte  denominação em kikongo:

Figura 4: À esquerda, Jissombe fresco e à direita, catatos secos (Imbrasia obscura).

Maiores consumidores de insectos do mundo

Os países que mais consomem insectos estão localizados em regiões tropicais, onde estes são maiores e mais fáceis de capturar. Segundo Tunel (2020), um dos insectos mais consumidos do planeta é a cochonilha (Dactylopius coccus). 

No continente africano, os países que se destacam são os Camarões e a República Democrática do Congo. No Sudeste Asiático, os insectos são apreciados na Tailândia, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Filipinas e Japão. Na América latina, o México e o Brasil são as principais referências.

Figura 5: Mapa da distribuição geográfica de espécies comestíveis de insectos no mundo. Fonte: Entomophagy and Anthropology, 2013

Importância ecológica dos insectos comestíveis

Comparados aos animais de corte tradicionais, os insectos precisam de menos espaço e água para se reproduzirem, apresentam maior fecundidade, melhor taxa de conversão alimentar e podem ser criados em resíduos orgânicos, contribuindo para a valorização da biomassa.

A combinação de alto valor nutricional, menor impacto ambiental e baixos custos de produção, tornam os insectos particularmente interessantes como mini rebanhos voltados para a alimentação humana (Junior, et al., 2018).

A degradação das florestas e a sua transformação acelerada em savanas arbustivas  poderia resultar no desaparecimento de lagartas e térmitas comestíveis, consideradas alimentos suplementares de alta energia e de primeira escolha.

A captura intensiva e descontrolada de insectos também representa uma séria ameaça para algumas espécies, por isso indicamos alguns desafios aplicáveis à realidade angolana, para sensibilizar as populações locais e promover a manutenção da biodiversidade do habitat e das espécies, nomeadamente:

Mais do que simples comida, os insectos são importantes provedores de serviços ecológicos, realizando funções quer de predadores como de presas, estando envolvidos em inúmeras teias alimentares (ex: reciclando nutrientes, fazendo a manutenção da estrutura e fertilização dos solos) e actuando como polinizadores de muitas espécies de plantas (Santos et al, 2018).

Considerações finais

Em suma, a entomofagia é uma boa opção para a segurança alimentar e a criação de insectos uma das soluções para a problemática da fome e das alterações climáticas. 

Embora Angola possua pouca bibliografia sobre insectos comestíveis, esta é uma área de bastante interesse, como alternativa para diversificação da alimentação e da economia, pelo que as instituições de ensino superior e laboratórios de pesquisa, deverão apostar na investigação científica e divulgação de mais informação sobre o assunto, possibilitando a arrecadação de receitas e o uso sustentável desses recursos naturais.

REFERÊNCIAS

  1. FAO (2013) Edible insects: Future prospects for food and feed security. Roma
  1. FAO (2015) A Contribuição dos insectos para a segurança alimentar, subsistência e meio ambiente. Consultado a 01/05/2022. Disponível no link: https://www.ruralbit.com/client_manager/files/1433246501-7432.pdf
  1. FELIX, M. M. & CARVALHO, B. P (2006) Alimentação e nutrição em Angola – Importância de produtos locais subvalorizados. Editora ISA PRESS. Extraído da Publicação no âmbito do Mestrado em Agronomia e Recursos Naturais, da Faculdade de Ciências Agrárias, da Universidade Agostinho Neto e Instituto Superior de Agronomia, da Universidade Técnica de Lisboa.
  1. JUNIOR, A. B.JANUÁRIO, L. A., NETTO, F. M., MARIUTTI B. L. R. (2018) Composição de insectos comestíveis. Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia de Alimentos, Campinas, SP, Brasil. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia, Ariquemes, RO, Brasil. Consultado a 01/05/2022. Disponível no link: https://www.researchgate.net/publication/327118458_Composicao_de_insetos_comestiveis/link/5b7ae3d04585151fd123b839/download
  1. MESSIAS, M. C. (2011) Vivendo com os insectos. Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos  – Biomanguinhos/ Fundação Osvaldo Cruz (FIOCRUZ). Rio de Janeiro, RJ. Consultado a 01/05/2022. Disponível no link:  https://www.bio.fiocruz.br/images/livro-insetos.pdf
  1. MIGNON, J. (2002) Entomophagie: une question de culture? Publicado em TROPICULTURA, 2002, 20, 3, 151-155, Zoologie générale et appliquée, Faculté Universitaire des Sciences Agronomiques de Gembloux, 2, Passage des Déportés, 5030 Gembloux, Belgique. Disponível no link:  0329 TROPICULTURA COVER (uliege.be)
  1. NETO, E. M. C (2003) Insetos como fontes de alimentos para o homem: valoração de recursos considerados repugnantes. Interciencia, vol. 28, número 3. Caracas, Venezuela. Consultado a 01/05/2022. Disponível no link: https://www.redalyc.org/pdf/339/33907802.pdf
  1. ROMEIRO, E. T., OLIVEIRA, I. D. & CARVALHO, E. F. (2015) Insetos como alternativa alimentar: artigo de revisão. Contextos da Alimentação – Revista de Comportamento, Cultura e Sociedade, Vol. 4, número 1, São Paulo: Centro Universitário Senac ISSN 2238-4200, ver página 45. Consultado a 14/05/2022. Disponível no link: http://www3.sp.senac.br/hotsites/blogs/revistacontextos/wp-content/uploads/2015/10/54_CA_artigo_ed_Vol_4_n_1_15_2.pdf.  
  1. SANTOS, M., SILVA, R.A., ANTUNES, S.C., (2018) Artrópodes, Revista Ciência Elementar, Volume 6, número 2. Departamento de Biologia, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Site Casa de Ciências da Fundação Belmiro de Azevedo. Consultado a 01/05/2022. Disponível no link: https://rce.casadasciencias.org/rceapp/art/2018/042/
  1. TUNES, S. (2020) Insectos comestíveis com alto valor protéico, grilos, larvas de besouros e formigas conquistam espaço como alternativa alimentar; Brasil dá os primeiros passos para disputar esse mercado. Pesquisa FAPESP. Brasil. Consultado a 01/05/2022.
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